O Rabo do Cavalo

Uma história de rabo de cavalo começa assim. Ou, ainda, não começa, por não ter fim. Mas, vá lá: o lado de início, já que temos de iniciar até as coisas sem começo, fica à escolha do leitor, direito ou esquerdo.
Neste -suposto primeiro- lado, uma cócegazinha pousa em mínimo turbilhão. E a lambada do rabo do cavalo chispa ela dali.
Ainda antes de consumada aquela coceirazinha aliviada de pós cócegas, o sistema nervoso do rabo do cavalo -e o rabo tem também consciência autônoma, senão sentimentos próprios! - já prepara a chicotada oposta: do outro lado, uma ou outras cócegas mínimas vibram a impaciência do cavalo do rabo.
Aí está, pois, o moto-contínuo do rabo do cavalo.
Esta história, já bem ou mal iniciada, tem um problema: a súbita necessidade de um objetivo que vá além do simples rabo, envolva o homem. São aquelas vozezinhas sobre os ombros, que freqüentemente encabulam os ditos livres pensadores.
O humano, mantenedor de sua dominação sobre o animal, agora, no seu narcisismo, me chama a enfiá-lo, à força, nesta simples historinha de rabo de cavalo, como se fosse sacrilégio ou divagação um texto de bicho sem sua inclusão, magnânimo.
Então, sou obrigado a inventar uma função de metáfora pro rabo do cavalo... Que vergonha!
Ah, se eu tivesse um rabo na testa, consciente e autônomo como o do cavalo! Meus ombros não ficariam livres das cócegas, mas minhas coceiras aliviadas, entre cada lambada precisa nas vozezinhas, seriam bem mais reconfortantes que as do cavalo…
E talvez não tivesse sempre a tentação de enfiar a cara humana (quando falo) na bunda do cavalo.